80 anos de uma enfermeira brasileira na linha de frente da 2ª Guerra Mundial


03.07.2024

Em uma madrugada como a de hoje, em junho de 1944, a enfermeira Virgínia Portocarrero partiu do Rio de Janeiro em direção a um destino que deixaria qualquer família sem sono. Aos 26 anos, ela foi para a guerra na Itália, compondo um grupo de 73 mulheres, as primeiras profissionais de Saúde incorporadas ao serviço militar no Brasil.

Não que o chamado patriótico fosse estranho: corria no seu sangue. Filha do general Tito Portocarrero e sobrinha de tios com história de participação na Guerra do Paraguai, sempre teve o serviço militar como vocação.

O torpedeamento da Alemanha nazista contra navios mercantes brasileiros deixou grande número de inocentes mortos, incendiou a opinião pública e criou o ambiente para a realização desta vocação. Depois de ser pressionado por anos, Getúlio Vargas finalmente decidia pelo lado dos Aliados e declarava guerra ao Eixo. O Brasil entrava para a 2ª Guerra Mundial com um contingente de 25 mil pessoas, em 1942.

A criação da Força Expedicionária Brasileira (FEB) mais que viabilizou, exigiu a integração de enfermeiras brasileiras ao Exército. Os feridos que a guerra deixava já eram demais para as enfermeiras americanas – que, ademais, não falavam português. As profissionais brasileiras foram arregimentadas para cuidar dos hospitais de campanha.

A trajetória do Brasil na Itália acabaria vitoriosa: a batalha de Monte Castello até hoje é lembrada como a mais alta façanha militar do país desde a Guerra do Paraguai, e veio com o custo da vida de quase 500 brasileiros mortos em combate.

Perfil ideal – Virgínia era uma candidata ideal. Solteira e sem filhos, estava dentro da faixa de 20 a 40 anos, era já formada em Enfermagem Samaritana pela Cruz Vermelha e tinha nascido no Rio, em 1917 (apenas brasileiras natas serviam). Mulheres casadas só poderiam ingressar na FEB com a autorização do marido. Ela procurou em 1943 um posto de alistamento sem o conhecimento dos pais ao ler no jornal O Globo a notícia sobre o voluntariado. Acabou selecionada após os testes de aptidão.

Um ano depois, concluiu o Curso de Emergência de Enfermeiras da Reserva do Exército e estava pronta para o front. Às quatro horas da manhã foi apanhada em casa num jipe do Exército que a levaria ao quartel-general de onde partiria seu avião para a Base Aérea de Parnamirim, em Natal. De lá, finalmente rumaria para Nápoles, na Itália, onde iniciaria seus serviços no conflito.

Paralisia – Seu primeiro contato com o combate não foi suave. Surpreendida por um bombardeio ao porto de Nápoles, contou depois que ficou paralisada de medo na cama e não teve coragem nem para se levantar e ir até o abrigo. “Simplesmente não sentia minhas pernas. Depois, habituei-me e nem ligava mais”, relatou em entrevista.

Além do cuidado, o trabalho das enfermeiras da FEB nas operações incluiu situações complexas, além do cuidado de pacientes críticos, era necessário rápidas mudanças de lugar dos hospitais de campanha, já que o Serviço de Saúde precisava acompanhar o avanço das tropas. Virgínia participou da evacuação de um hospital em Pisa, que acabou totalmente invadido pela água durante uma enchente do Rio Arno e dando perda total, salvando apenas os pacientes.

Com passagem por oito hospitais durante 11 meses na guerra, seguiu uma rotina extenuante, com plantões de 15 dias seguidos em Pistoia e relatórios diários em inglês. Acabou de volta ao Brasil em julho de 1945, condecorada e elogiada pelas Forças Armadas brasileiras e americanas, mas foi reformada ao voltar ao país, como todas as enfermeiras da FEB. Seria reintegrada ao exército em 1957.

Além das condecorações, Virgínia acumulou também patentes de oficialato e seguiu na Enfermagem do Exército até se reformar como capitã, em 1963. Suas honrarias acumuladas incluíram as Medalhas de Guerra, de Campanha, da Cruz Vermelha Brasileira, Marechal Mascarenhas de Moraes, do Pacificador e Serviço de Saúde da FEB. Ela receberia, ainda, o título de Aluna Emérita do Colégio Pedro II.

Virgínia Portocarrero morreu aos 105 anos, em sua cidade natal, em março de 2023. Foi a última enfermeira do seu grupo da FEB a partir. Nunca pensou que poderia não ter sido voluntária na guerra. “Não tenho nenhum arrependimento por ter ido. Tenho é orgulho de ter acompanhado uma tropa de tamanho valor”, disse. Seu arquivo, com um diário, cartas, fotos e recortes de jornal está disponível para consulta na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

Fonte: Ascom Cofen, com informações do Café História, colégio Pedro II, arquivo da Fiocruz e Enfermagem Revista

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