PARECER COREN – BA N⁰ 006/2016

Assunto: Sondagem gástrica em recém-nascido.

08.09.2016

1. O fato:

Solicito Parecer Técnico sobre a competência técnica do profissional de nível médio (Técnico de Enfermagem) na passagem de sonda orogástrica em pacientes recém-nascidos internados em UTI Neonatal.

2. Fundamentação legal e Análise:

 A sondagem gástrica consiste em introduzir uma sonda no tubo digestivo por via nasal (nasogástrica) ou por via oral (orogástrica) (BARBA, 2006) e a segurança e a eficácia da nutrição enteral dependem da correta colocação das sondas de alimentação (ELLETT; WOODRUFF; STEWART, 2007; QUANDT, et al., 2009).

Esses dispositivos também são utilizados para promover a descompressão do estômago (drenagem de líquidos ou ar do estômago), para proporcionar o descanso do trato gastrointestinal, favorecendo a cicatrização após cirurgia intestinal, como também podem ser usados para monitorar sangramento, e para realizar lavagem gástrica.

A sondagem gástrica via oral ou via nasal, é um procedimento imprescindível no auxílio à nutrição de recém-nascidos pré-termo, com até trinta e quatro semanas de idade gestacional, aproximadamente, pois os mesmos ainda não possuem reflexos de sucção e de deglutição plenamente desenvolvidos como afirmam ZIEGEL; CRANLEY( 1985).

Nos recém-nascidos, a utilização da sonda orogástrica é preferível por preservar as vias aéreas superiores, uma vez que a respiração dos mesmos é eminentemente nasal e não nasal e/ou bucal como no adulto (SILVA et al., 2000). As sondas colocadas por via oral, porém, apresentam maior possibilidade de deslocar-se do local inserido, devido ao movimento da boca e língua do bebê e, decorrente destes movimentos, pode traumatizar a mucosa e aumentar a incidência de apneia e bradicardia por estimulação vagal (HAWES; McEWAN; McGUIRE, 2008). Segundo Tamez e Silva (2013), o método preferencial recomendado para a inserção da sonda nessa população é a via orogástrica.

Pesquisas apontam para as possíveis complicações do uso da sonda gástrica em recém-nascidos. Estas complicações são relacionadas a técnicas de introdução, tipo de fixação externa, tempo de permanência da sonda, comprometimentos no trato gastrointestinal que vão desde discretas escoriações e hiperemias até, em casos extremos, a graves perfurações gástricas iatrogênicas. Se inserido um comprimento de sonda maior que o indicado para o tamanho do bebê, pode ocorrer de a sonda permanecer enrolada no interior do estômago, podendo erroneamente sugerir a não retenção da alimentação, enquanto que os orifícios da sonda podem estar acima do nível da dieta (BOER; SMIT; MAINOUS, 2009). A dieta administrada diretamente no intestino, devido ao erro de colocação, pode contribuir para intolerância alimentar (QUANDT et al., 2009). Se a sonda ignora o piloro e ocorre a administração da dieta no duodeno, pode ocorrer o surgimento de lesões gastrointestinais (BOER; SMIT; MAINOUS, 2009).

Além disso, em bebês extremamente prematuros, pode ocorrer uma perfuração esofágica em consequência de erros de posicionamento (SU et al., 2008). Recém-nascidos de extremo baixo peso são igualmente suscetíveis. Nestes casos, a perfuração esofágica está associada à inserção e aspiração das sondas nasogástricas e orogástricas, e na entubação endotraqueal difícil (SUDHAKARAN; KIRBY, 2000). As sondas inseridas na parte superior do esôfago podem ocasionar não somente a perfuração do esôfago, mas, também, problemas de aspiração, refluxo gastresofágico e pneumonias (QUANDT et al., 2009). Em alguns casos, o erro de posicionamento pode ser tardiamente percebido, aumentando o risco de apneia, dessaturação e bradicardia (BOER; SMIT; MAINOUS, 2009).

A estes elementos somam-se algumas manifestações observadas nos neonatos que podem indicar desconforto, como a presença do choro, náuseas e discreta taquipnéia durante a sua introdução; hiperemia na região supra labial devido à fixação direta sobre a pele friável do recém-nascido; compressão gengival durante longa permanência de uso.

Considerando que a Lei n. 7.498 de 25 de junho de 1986 que dispõe sobre a Regulamentação do Exercício da Enfermagem e dá outras providências:

Art. 11. O Enfermeiro exerce todas as atividades de enfermagem, cabendo-lhe:

I – Privativamente: […] l) cuidados diretos de enfermagem a pacientes graves com risco de vida; m) cuidados de enfermagem de maior complexidade técnica e que exijam conhecimentos de base científica e capacidade de tomar decisões imediatas.

Considerando a resolução COFEN nº 453/2014, que Aprova a Norma Técnica que dispõe sobre a Atuação da Equipe de Enfermagem em Terapia Nutricional:

Compete ao Enfermeiro:

a) Participar da escolha da via de administração da NE em consonância com o médico responsável pelo atendimento ao paciente e a EMTN;

b) Estabelecer o acesso enteral por via oro/gástrica ou transpilórica para a administração da NE, conforme procedimentos pré-estabelecido;

[…]

Compete ao Técnico de Enfermagem:

a) Participar de treinamento, conforme programas estabelecidos, garantindo a capacitação e atualização referente às boas praticas da Terapia Nutricional;

b) Promover cuidados gerais ao paciente de acordo com a prescrição de enfermagem ou protocolo pré-estabelecido;

c) Comunicar ao Enfermeiro qualquer intercorrência advinda da TNE;

d) Proceder o registro das ações efetuadas, no prontuário do paciente, de forma clara, precisa e pontual.

Considerando a Resolução COFEN nº 358, de 15 de outubro de 2009, que dispõe sobre a Sistematização da Assistência de Enfermagem e a implementação do Processo de Enfermagem em ambientes, públicos e privados, em que ocorre o cuidado profissional de Enfermagem:

Art. 1º O Processo de Enfermagem deve ser realizado, de modo deliberado e sistemático, em todos os ambientes, públicos ou privados, em que ocorre o cuidado profissional de Enfermagem:

Considerando a Resolução COFEN nº 311 de 2007 que normatiza o Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem:

Princípios Fundamentais […] O profissional de enfermagem atua na promoção, prevenção, recuperação e reabilitação da saúde, com autonomia e em consonância com os preceitos éticos e legais.

Art. 1. (Direitos) Exercer a enfermagem com liberdade, autonomia e ser tratado segundo os pressupostos e princípios legais, éticos e dos direitos humanos.

Art. 2. (Direitos) Aprimorar seus conhecimentos técnicos, científicos e culturais que dão sustentação a sua prática profissional.

Art. 12. (Responsabilidades e Deveres) Assegurar à pessoa, família e coletividade assistência de Enfermagem livre de danos decorrentes de imperícia, negligência ou imprudência.

Art. 13. (Responsabilidades e Deveres) Avaliar criteriosamente sua competência técnica, científica, ética e legal e somente aceitar encargos ou atribuições, quando capaz de desempenho seguro para si e para outrem.

Art. 32. (Proibições) Executar prescrições de qualquer natureza, que comprometam a segurança da pessoa.

Art. 33. (Proibições) Prestar serviços que por sua natureza competem a outro profissional, exceto em caso de emergência.

Art. 36 (Direito) Participar da prática multiprofissional e interdisciplinar com responsabilidade, autonomia e liberdade.

3. Conclusão:

Diante do exposto, e considerando a complexidade, a demanda de conhecimento cientifico e habilidade técnica necessárias para execução do procedimento em questão, concluímos que o procedimento de sondagem gástrica, dentro da equipe de enfermagem, é da competência do enfermeiro, cabendo a toda equipe de enfermagem o cuidado contínuo na manipulação e manutenção do dispositivo. Recomendamos que os profissionais de enfermagem exerçam suas ações, fomentadas pela elaboração efetiva da Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE), conforme Resolução COFEN nº 358/2009, e que os serviços criem protocolos assistenciais de boas práticas, considerando a legislação especifica e as atribuições de cada categoria da equipe, com posterior validação pelos respectivos responsáveis técnicos e imediata capacitação de todos os envolvidos no processo assistencial.

 É o nosso parecer.

 

Salvador, 07 de julho de 2016

 

Enf.ª Mara Lucia de Paula Souza – COREN-BA61432-ENF

Enf.ª Maria Jacinta Pereira Veloso – COREN-BA 67976-ENF

Enfª Nadja Magali Gonçalves – COREN-BA 70859-ENF

Enf.ª Sirlei Santana de Jesus Brito – COREN-BA 47858-ENF

4. Referências:

a. BARBA, Yolanda Gamarra. Sondajes. In: ______.Técnicas de enfermería en el paciente crítico. Alcalá La Real: Formación Alcalá, 2006. 326 p. p. 133-142.

b. Lei nº 7.498 de 25 de junho de 1986, que dispõe sobre o Exercício profissional da Enfermagem, e dá outras providências. Disponível em: http://www.portalcofen.gov.br

c. Decreto nº 94.406 de 08 de junho de 1987 que regulamenta a Lei nº 7.498 de 25 de junho de 1986, que dispõe sobre o Exercício profissional da Enfermagem, e dá outras providências. Disponível em: http://www.portalcofen.gov.br

d. Resolução COFEN nº 191 de 1996, que dispõe sobre a forma de anotação e o uso do número de inscrição ou de autorização, pelo pessoal de enfermagem. Disponível em: http://www.portalcofen.gov.br

e. Resolução COFEN nº 311 de 2007, que aprova a reformulação do Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem. Disponível em: http://www.portalcofen.gov.br

f. Resolução COFEN nº 358 de 2009, que dispõe sobre a Sistematização da Assistência de Enfermagem e a implementação do Processo de Enfermagem em ambientes, públicos e privados, em que ocorre o cuidado profissional de Enfermagem. Disponível em: http://www.portalcofen.gov.br

g. Resolução COFEN nº 429 de 2012, que dispõe sobre o registro das ações profissionais no prontuário do paciente, e em outros documentos próprios da enfermagem, independente do meio de suporte – tradicional ou eletrônico. Disponível em: http://www.portalcofen.gov.br

h. BORRELL JG, Silva IA. Sonda gástrica em recém-nascido pré-termo: estudo das alterações de flexibilidade do polímero constituinte. Rev. Esc. Enf. USP. 2008, 34(3): 302-8.

i. BOER, Jacoba (Coby) de; SMIT, Bert J.; MAINOUS, Rosalie O. Nasogastric Tube Position and Intragastric Air Collection in a Neonatal Intensive Care Population. Advances In Neonatal Care, Rotterdam, v. 9, n. 6, p. 293-298, 11 dez 2009.

j. CONSELHO FEDERAL DE ENFERMAGEM. Resolução COFEN nº 53/2014. Aprova a norma técnica que dispõe sobre a atuação da equipe de enfermagem em terapia nutricional. 2014. Disponível m: http://www.cofen.gov.br/resolucao-cofen-no-04532014_23430.html

k. QUANDT, Daniel et al. Malposition of Feeding Tubes in Neonates: Is It an Issue? Journal of Pediatric, Gastroenterology and Nutrition, Zurich, v. 48. n. 5, p. 608-611, may 2009.

l. SILVA, Maria Helena Abud da et al. Alimentação do bebê prematuro e de muito baixo peso ao nascer: subsídios para a assistência de enfermagem em berçário. São Paulo: Revista Brasileira de Medicina, 2000. Disponível em: <http://www.cibersaude.com.br/revistas.asp?fase=r003&id_materia=494>. Acesso em: 27 out 2010.

m. SU, Bai-Horng et al. Esophageal Perforation: A Complication of Nasogastric Tube Placement in Premature Infants. Journal of Pediatrics, Taichung, v. 154, n. 3, p. 460-461, mar. 2009.

n. TAMEZ RN, Silva MJP. Enfermagem na UTI neonatal. Assistência ao recém-nascido de alto risco. 5ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2013.

o. ZIEGEL, E. E.; CRANLEY, M. Recém-nascidos de alto risco. In: ZIEGEL, E. E; CRANLEY, M. S. Enfermagem obstétrica. Rio de Janeiro, Interamericana, 1985. Cap.26, p.493.

 

 

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